O maniqueísmo estatal: como fugir dele?

Posted on 24 de novembro de 2018

A política moderna, seja em nosso país ou no plano global, têm se caracterizado cada vez mais pela intensa polarização entre esquerda e direita. Infelizmente, no Brasil, esse debate se encontra ainda mais sucateado, uma vez que os conceitos de direita e esquerda estão restritos aos grandes partidos políticos. Apesar disso, a discussão desses conceitos abrange muito mais que “ideologia”, envolvendo conceitos de cultura, sociedade, economia e Estado.

Nesse contexto, uma das problemáticas que mais tem levantado polêmicas na atualidade são os diferentes conceitos de Estado. O termo, derivado do status, tem origem no século XIII e faz referência a qualquer país soberano, com estrutura própria e politicamente organizado, bem como designa o conjunto das instituições que controlam e administram uma nação. Desde então, a instituição estatal – que possui uma base de prescrições jurídicas e sociais a serem seguidas – evidencia-se como “casa-forte” das leis que devem regimentar e regulamentar a vida em sociedade.

Apesar de apresentar-se como um conceito relativamente simples, ainda hoje não há, nos estudos de política e sociedade, um consenso sobre o que é Estado. Talvez por isso – e pela falta de educação política na educação de base – podemos observar uma clara confusão entre “governo” e “Estado” na agenda pública. O segundo é uma organização política, social e jurídica – e ocupa territórios definidos pela Carta Magna. O “governo” é responsável pela gestão e direção desse Estado, possuindo soberania reconhecida tanto interna como externamente. Um Estado soberano é sintetizado pela máxima “Um governo, um povo, um território”.

A divisão setorial sociológica mais comum, considera o Estado como o Primeiro Setor, enquanto o Mercado e as demais entidades da Sociedade Civil se posicionam, respectivamente, como Segundo e Terceiro Setores. O tamanho desse Estado, contudo, é uma das maiores divergências entre os teóricos da ciência política.

Abordemos os dois extremos dessa discussão. O “Estado mínimo” – expressão originária no antro do neoliberalismo – é uma corrente surgida entre as décadas de 1970 e 1980 que procura reviver o capitalismo laissez-faire do liberalismo clássico dos séculos XVIII e XIX. Um Estado que ilustra bem este conceito é o estadunidense, do período de 1780 até 1913. Neste intervalo, o país passou de uma economia rural e primitiva para o país mais rico e industrializado do mundo. A concepção de “Estado mínimo” nasceu de uma reação à maciça presença dos estados nas economias de todo o mundo durante a maior parte do século XX.

Grosso modo, o Estado mínimo é aquele que intervém o mínimo possível no contexto socioeconômico de uma Nação, esperando que este procedimento maximize o progresso e a prosperidade do país. Os defensores deste modelo estatal defendem que as únicas funções do Estado seriam a promoção da segurança pública, da justiça e do poder de polícia, além da criação de legislação necessária para assegurar o cumprimento destas funções. O Estado minarquista, entretanto, não deve ser confundido com o anarcocapitalismo – que recusa a ideia de Estado e acredita que é impossível conter suas forças de expansão. Em contrapartida, o Estado máximo compreende um modelo de política governamental baseado em políticas públicas mais intervencionistas, controladoras e, por vezes, autoritárias.

Assim, enfrentamos um dilema entre esses dois modelos de Estado. Muitos reclamam do tamanho e da interferência do Estado na economia e nas vidas dos cidadãos, porém, defendem o Estado Mínimo única e exclusivamente quando ganham com ele. Um comportamento comum entre os privilegiados é o de defender o minarquismo quando os lucros são extraordinários, com as receitas aumentando substancialmente e fazendo-se de tudo para sonegar imposto e contribuição – mas, quando há prejuízo e crise, clamam pela presença e o socorro do Estado.

Pensando estrategicamente… não é chegado o momento – com a iminência de um novo governo e de uma possível reestruturação estatal – de deixarmos este maniqueísmo de lado e passarmos a encarar o Estado brasileiro sob uma perspectiva pluralista? O conceito, muito popular nos Estados Unidos, enxerga a instituição estatal como uma arena neutra para a resolução de litígios entre grupos de interesses ou como um conjunto de agências que agem simplesmente como um outro conjunto de grupos de interesse. O pluralismo é capaz de prever a difusão de poderes em toda a sociedade, tendo como resultado uma política estatal que é produto da recorrente negociação.

Os últimos anos têm demonstrado que a polarização tem empacado nosso desenvolvimento enquanto Nação e dividido cada vez mais os setores da sociedade civil. Pensar um Estado pluralista é, acima de tudo, encontrar o equilíbrio, um terreno que saiba lidar com os “prós” e os “contras” de todos os conceitos de Estado. O Estado brasileiro já está à beira da exaustão, o empobrecimento é visível e a redução de possibilidades e recursos está à vista. Para sairmos desta situação e pensarmos um novo projeto de Brasil, é preciso que exerçamos a ponderabilidade: nem tanto ao mar, nem tanto à terra.


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