A Torre de Babel que virou o governo brasileiro

Posted on 8 de novembro de 2017

Gênesis, um dos mais importantes livros da Bíblia, já citava a Torre de Babel. Essa obra foi executada pelos descendentes de Noé, após o Dilúvio, com a intenção de eternizar seus nomes. A decisão era fazê-la tão alta que alcançasse o céu. Segundo o Antigo Testamento, esta soberba provocou a ira de Deus que, para castigá-los, confundiu-lhes as línguas e os espalhou por toda a Terra.

Hoje, entende-se esta história como uma tentativa dos povos antigos de explicar a diversidade de idiomas. No entanto, ainda restam no Sul da antiga Mesopotâmia ruínas de torres que se ajustam perfeitamente à torre de Babel descrita pela Bíblia.

Essa narrativa lhe parece familiar?

As línguas confusas nos lembram, por exemplo, a falta de entendimento entre os três poderes do País. Isso sem falar ainda na prepotência e busca incansável pelo poder.

Claro, já sabemos que o Executivo administra, o Legislativo cria normas e o Judiciário julga conflitos. Mas, na prática, isso acontece ou você também tem a impressão de que, por vezes, o Legislativo julga, o Executivo legisla e o Judiciário fica preso entre esses conflitos?

A confusão direta entre integrantes do Legislativo, Judiciário e Executivo começou a mostrar sua face a partir do impeachment, criando um clima de tensão inédito no País. Foram ameaças públicas entre ministros e parlamentares, cutucadas entre os membros do Supremo Tribunal Federal (STF) e negociatas diante dos nossos olhos por cargos em troca de votos, deixando às claras uma crise política que ameaçou e ainda ameaça os três poderes da República.

Um exemplo disso foi quando o ministro do Supremo Marco Aurélio Mello determinou que o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), aceitasse o pedido de impeachment contra o vice-presidente Michel Temer (PMDB-SP). Na época, o ministro alegou que Cunha não poderia arquivar o pedido, uma vez que caberia a uma comissão especial integrada por parlamentares avaliar se as acusações tinham ou não consistência.

Eduardo foi enfático. Disse que a decisão do STF era absurda e que não seria acatada. O ministro não deixou barato e rebateu, dizendo que entendia o “direito de espernear” de Cunha, mas anunciou que caso a decisão não fosse cumprida, Eduardo cometeria crime de responsabilidade. Resultado? Cunha voltou atrás e acatou a determinação.

Outro recente caso foi o de Aécio Neves. As medidas cautelares impostas pelo Supremo Tribunal Federal marcam mais um episódio de estranhamento nas relações entre os Poderes da República. Diante do então afastamento de Aécio e a proibição de suas saídas no período noturno, as reações começaram a ficar explícitas mais uma vez. Senadores passaram a questionar a competência do Judiciário. Parlamentares diziam que o Supremo não tinha prerrogativa para afastar parlamentares do mandato, ou seja, que o STF teria ferido o princípio de autonomia dos poderes ao tomar uma decisão que caberia exclusivamente ao próprio Legislativo.

Incoerências, desajustes, desarmonia, incongruência, insensatez, contrassensos, paradoxo e uma grande inconsistência é o que tem refletido os três poderes, enquanto na verdade, o que deveríamos enxergar é uma verdadeira consonância entre essas esferas que se complementam – ou deveriam se complementar.

Mais do que nunca, é preciso pensar estrategicamente. Situações como essas que vivemos na atual política brasileira mostram a enorme necessidade de a sociedade se informar, pois, quando esses poderes falham, é a cidadania que deve oferecer as respostas. Quem, senão o cidadão, é o grande responsável pela democracia? Somos os maiores beneficiados e cabe a nós uma luta constante para que nossos direitos sejam assegurados, independentemente de partidarismos, amizades, acordos ou conluios políticos.

Veja bem: não existe uma regra que determine como esses poderes devem se portar ou se relacionar. Mas tendo em vista a importância de cada um, o mínimo que se espera deles é harmonia e diálogo – o que definitivamente não aconteceu em 2016, 2017 e, infelizmente, tão pouco pode-se acreditar para o próximo ano.

Na verdade, o que vimos acontecer à luz do dia foi um Legislativo legislando para seu próprio umbigo, um Judiciário julgando incontidamente e um Executivo amedrontado diante de todos os outros poderes, ignorando as leis para garantir sua permanência, independentemente do preço que o País pagará para garantir a esbórnia.


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