A globalização e a financeirização da riqueza

Posted on 12 de janeiro de 2019

“O mundo está mudando”: esta é a frase que tem dominado a agenda pública desde o início do milênio, quando as tecnologias da comunicação e informação avançaram subitamente e tomaram conta das nossas vidas nos mais diversos aspectos. Mas, quando dizemos “mudança”, estamos falando dos mais diferentes âmbitos de nossa sociedade: desde o modo como nos relacionamos até o modo como nos informamos e consumimos.

Nesse sentido, é preciso refletirmos algumas das principais mudanças sofridas pelo capitalismo – sistema econômico e social que impera na maior parte do globo. O capitalismo é baseado, em essência, na legitimidade dos bens privados e na irrestrita liberdade de comércio e indústria, tendo como principal objetivo a obtenção de lucros e a acumulação de riquezas através dos meios de produção. Vale ressaltar que, nesse sistema, os meios de produção e de distribuição são de propriedade privada e o maior esforço deste processo está nas mãos dos trabalhadores.

A desigualdade social também aparece como característica intrínseca a esse sistema, ressaltando a divisão de classes entre trabalhadores e empresários. Em tese, os governos existiriam em sociedades capitalistas apenas para banir a iniciação de violência humana. Existe um sistema político e econômico que apresenta ideias opostas ao sistema capitalista: o socialismo, teoria que propõe a apropriação pública dos meios de produção e a supressão das diferenças entre as classes sociais, sugerindo uma reforma gradual da sociedade capitalista – mas, no período pós-Guerra Fria, esse sistema perdeu forças e o capitalismo encontrou seu caminho para a hegemonia.

Desde suas fases embrionárias, o capitalismo atravessou diversas mudanças internas que alteraram suas dinâmicas e culminaram em grandes reflexos nas sociedades ocidentais. Suas principais fases foram: o capitalismo comercial ou mercantil, que vigorou dos séculos XV ao XVIII; o capitalismo industrial, surgido no século XVIII com a Revolução Industrial; o capitalismo financeiro ou monopolista, iniciado após a Segunda Guerra Mundial e marcado pelo poderio dos bancos e instituições financeiras; e, finalmente, o capitalismo informacional, cognitivo ou do conhecimento, iniciado no período pós-Guerra-Fria, marca o avanço da globalização e das tecnologias mencionadas anteriormente.

A globalização corresponde aos processos de aprofundamento da integração econômica, social, cultural e política, impulsionados pelo barateamento dos meios de transporte e comunicação dos países do mundo no final do século XX. Ela é gerada pela necessidade da dinâmica do capitalismo em formar uma aldeia global que permita maiores mercados para os países centrais. Graças à globalização, o capitalismo se transformou num sistema completo e maduro, uma vez que, ao se expandir por todo o planeta, o sistema unificou mundialmente o ciclo econômico.

A globalização também apresenta aspectos preocupantes: com ela, o sistema se aproxima cada vez mais do seu limite de reprodução, o que acarretaria em uma crise global de superprodução. Assim, o fenômeno da “financeirização da riqueza” se apresenta como o contraponto funcional da incapacidade de o sistema desenvolver plenamente suas forças produtivas. Contudo, a criação da riqueza na órbita financeira é considerada “uma aventura sem futuro”, já que, quanto mais este modelo é aprofundado, maiores são as possibilidades de crise geral do sistema. A modernidade capitalista não obedece fronteiras, e seu futuro visível se expande a uma velocidade inesperada.

O início do século XXI foi recebido como uma época conturbada para a sociedade brasileira, e os sentimentos de crise e de impotência volta-e-meia retornam aos lares da população. Estamos sendo confrontados por uma crise ética, que se alastrou e se instalou dentro das instituições encarregadas de promover a integração da sociedade por via de canais democráticos e princípios republicanos. Vivemos num ambiente cujo contexto das relações de poder e suas estruturas produtivas nos remetem ao capitalismo concreto, inseparável da obtenção de lucros aqui e agora, sem a preocupação com a sobrevivência das gerações futuras.

Pensando estrategicamente… as tentativas de desenvolvimento até aqui empreendidas não tiveram pleno êxito em termos de organização social, e nossos governantes, ao demonstrarem incapacidade para realizar as reformas institucionais e políticas necessárias, preservaram uma arquitetura institucional que defende privilégios e direitos adquiridos, enquanto alimentam estruturas paralelas que contribuem para fomentar uma certa incoerência institucional, distanciando ainda mais o Estado da sociedade.

Compete a todos nós, brasileiros participarmos da construção social de uma nova institucionalidade, afinal, somos reconhecidamente um povo aberto a mudanças, flexíveis na adoção de novas regras. Novos movimentos têm sido iniciados pela sociedade, mas é necessário que haja uma visão de futuro compartilhada para que eles sejam sinérgicos e não dissipadores de energia.

O Estado – que, em princípio, deveria ser o guardião do bem público – necessita atualizar seus valores políticos. Estamos perdendo o sentido da “evolução”. O termo “globalização” e os processos de acumulação de capital oriundos da internacionalização da produção estão relegados a um segundo plano, acentuando o contraditório e apocalíptico conceito da financeirização da riqueza e alargando o fosso entre as classes sociais.


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