Empreendedora começou seu negócio do negativo

Posted on 2 de fevereiro de 2016

Quando Maristela Mafei tomou a decisão de abrir seu próprio negócio, parecia que havia uma conspiração para que ela desse meia volta e desistisse. Depois de deixar seu cargo de repórter no Jornal Folha de S. Paulo, ela sacou 800 dólares do FGTS para investir na empresa. Foi roubada. Um dia antes, tinham levado também seu carro, que não tinha seguro – não sobrou muita coisa que ela pudesse arriscar.
“O universo gritava ‘não abra!’. Mas eu segui em frente”.

A única alternativa foi vender sua linha de telefone residencial. Em 1995, ela valia aproximadamente 2mil dólares, o suficiente para alugar uma salinha de 6m² e colocar o negócio para rodar até ele começar a gerar receita. No escritório ou na rua, ela fazia de tudo, do café ao release de imprensa.

Com muita garra, Maristela aprendeu bastante, cresceu com o negócio e foi selecionada como uma das primeiras Empreendedoras Endeavor. Transformou a Máquina da Notícia em Grupo Máquina, e agora em Máquina Cohn & Wolfe, com a recente associação à WPP, líder mundial em publicidade e relações públicas. Inspire-se com essa história!

“Você é uma máquina!”

Quando assinou sua primeira matéria de capa de jornal, sua mãe recortou a reportagem e mostrou para todos os vizinhos. Criada no interior de São Paulo, Maristela Mafei sonhava em ser repórter de um jornal de grande circulação. Dava brilho nos olhos essa ideia de sair avidamente correndo atrás da informação.

Logo Maristela começou a conquistar seu espaço na redação e reputação fora dela. Com isso, veio um convite: tornar-se gerente de comunicação da Parmalat, que, na época, estava se expandindo no Brasil. Mas em vez de dizer “sim”, ela compartilhou uma preocupação: em uma grande empresa, deixaria de fazer um pouco o que gosta e de ser parte do core business. “Por que então você não abre sua própria empresa e passa a ser nossa fornecedora?”, sugeriu um gestor da Parmalat.

Maristela considerou. Lembrou como ficava irritada, como repórter, com o grau de atenção e profissionalismo das assessorias de imprensa com as quais conversava. Em 1995, a abertura política e econômica estava só começando e o Brasil passava por um processo de privatização. Havia um novo Código de Defesa do Consumidor, uma nova Constituição e as barreiras para a entrada de produtos estrangeiros haviam caído. Cresceu a demanda de empresas que precisavam se comunicar com todos os seus públicos e, principalmente, com a mídia.

Foi combinando sua experiência prévia, o ambiente propício e a oportunidade de já começar com a Parmalat como cliente que Maristela encontrou, nesse mercado, um enorme potencial para empreender. Mudou de lado do balcão – passou de uma caçadora de informação para uma provedora de informação e abriu sua pequena assessoria de imprensa.

E ela não começou apenas com um grande cliente, mas também com um grande mentor. Quando pediu demissão da Folha de S. Paulo, o falecido Sr. Octavio Frias, na época dono do veículo, a fez prometer que ela voltaria uma vez por mês para lhe contar tudo sobre o novo negócio. Ele a aconselhava sobre custos, tributação, gestão, e ainda se envolvia na parte comercial: “Eu mostrava alguma proposta que o cliente tinha achado caro e ele pedia para ver quem era”, conta Maristela. E ele incentivava: “Eu conheço! Pode fazer seu preço porque ele tem problemas, vai precisar de você”.

Foi também Frias que ajudou a batizar o negócio: “Você é uma máquina, tem que ter ‘máquina’ no nome”.

Sem vergonha

Maristela conta que, na época em que fez faculdade, o bonito das aulas de jornalismo era mandar o aluno ir para a rua e voltar com uma reportagem feita. Ela não tinha ideia do que era um ambiente corporativo, de como se comportavam nele.

Segundo ela, o sucesso inicial da Máquina se deve a um fator muito básico: nunca ter vergonha de pedir ajuda.

Eu visitava algum cliente e aproveitava a conversa: ‘olha, me desculpe, mas eu estou começando a contratar mais funcionários e queria te perguntar: como você estruturou o RH da sua empresa?’. E eles gostavam disso”, diz.

Enquanto possa ter sido um momento de muita dificuldade, Maristela assume que esse foi também um período engraçado, já que sempre recorriam a um improviso aqui ou ali. Os clientes começaram a demandar produtos – um clipping de imprensa, por exemplo – mas não havia dinheiro nenhum para investir. Quem resolvia era Uziel, o office boy (que está na Máquina até hoje, com outro cargo), que descia para a banca de jornais, comprava todos os impressos, lia tudo e recortava as matérias em que o cliente aparecia. E assim a empresa geria seus recursos – claro que não de forma ideal, mas ninguém ficava insatisfeito.

Por causa desse cuidado em atender (ou superar) expectativas, a enorme maioria dos clientes seguintes fechou acordo por meio de indicação. Os próprios gerentes de comunicação da Parmalat, quando faziam uma transição para outra empresa, queriam ser atendidos pela Máquina. O crescimento foi natural, mas o mundo dos negócios não é assim tão cor-de-rosa, e, naturalmente, vieram também os primeiros tombos.

O mais forte deles talvez tenha sido logo no terceiro ano da empresa, quando a Máquina enfrentou um problema sério de inadimplência. Foi também quando Maristela sentiu o impacto de ter dado tanta informalidade ao negócio – bom para a cultura interna, mas ruim para os relacionamentos comerciais: “Eu conseguia resolver os problemas dos clientes, entregar o que eles queriam, mas tinha muita dificuldade de fazer cobranças, por exemplo”.

Por não saber que era impossível, foi lá e fez

Ao mesmo tempo, toda a falta de planejamento fez bastante bem para a Máquina da Notícia, que aos poucos ia se tornando o Grupo Máquina. Maristela conta que muito ia aprendendo e fazendo com os desafios da rotina, no bom estilo “matando um leão por dia”.

Eu não sabia que era ‘impossível’ fazer muita coisa”. Foi assim que ela estruturou uma agência 360º, com áreas que vão de digital a relações governamentais, passando por assessoria financeira e núcleo de personalidades. Maristela sempre acompanhou as novidades do mercado, soube se antecipar e implementar uma cultura de inquietude intelectual muito forte: “Aprendemos muito com os executivos das empresas clientes, fomos buscar referências de reputação fora do país, fizemos cursos, viajamos, fomos ver o que é o que o mundo estava fazendo.

Isso nos trouxe horizontes inacreditáveis”, ela conta. Entre esses clientes, por exemplo, estão EY, Carrefour, BRMalls e outras gigantes, incluindo também grandes empreendedores e executivos, como Jorge Paulo Lemann.

Como resultado, a Máquina hoje tem 9 unidades de negócio e mais de 240 funcionários. Maristela Mafei se tornou uma das maiores especialistas desse setor do Brasil, com dois livros publicados, sendo a única Empreendedora Endeavor à frente de uma agência de Relações Públicas.

Com recém-completos 20 anos de estrada, Maristela recentemente conquistou mais motivos para celebrar. Isso porque toda a estratégia integrada, a excelência da entrega e a cultura do negócio atraíram também olhares de fora: semana passada, a Máquina passou a fazer parte da Cohn & Wolfe, subsidiária da WPP, líder mundial de publicidade e relações públicas.

Essa parceria vai trazer forças globais sem precedentes, que não só fortalecem nossos clientes com negócios internacionais, como devem atrair outros pela América Latina. Nós vamos continuar oferecendo o melhor da nossa cultura, mas agora associados a uma das maiores agências do mundo! Eu não poderia estar mais orgulhosa das conquistas do nosso time e do trabalho que fizemos pelos nossos clientes”, conta Maristela. Que venham os próximos 20 anos!

Texto: EXAME


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